terça-feira, 3 de dezembro de 2013

IDENTIFICAÇÃO DE RISCOS

Os fatores de risco que podem causar LERDORT são divididos em três grupos:
biomecânicos, organizacionais e psicossociais
1.

Apesar destas lesões serem relacionadas com as condições de trabalho, mesmo quando realizam as mesmas atividades nas mesmas condições, alguns trabalhadores desenvolvem e outros não2; 3. Por isso, considera-se que a LERDORT é causada pela interação de fatores, sendo portanto, multifatorial3; 4; 5; 6. Além dos fatores relacionados ao trabalho, há participação de outras atividades extra-laborais (fora do trabalho), como por exemplo, fatores da lida doméstica, jardinagem, trabalhos manuais, tricôt e modelagem.

Isso dificulta tanto consolidar o diagnóstico como a relação com o trabalho7, e causa situações conflituosas para o trabalhador na empresa, na família, na sociedade e órgãos governamentais responsáveis8.

Fatores Biomecânico
Biomecânicos e ergonômicos são os fatores relacionados à posição e movimento do corpo humano dentro do ambiente de trabalho: a temperatura ambiente, vibração, exposição a traumas, posição das articulações, postura do corpo, intensidade de força, movimentos repetitivos2; 3; 4; 9.

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Por exemplo, a digitação por tempo prolongado causa fadiga. A tendência é largar os braços sobre a mesa para aliviar a fadiga, deixando as articulações, principalmente do punho, em posições inadequadas, por tempo prolongado e exigindo mais força para realizar a mesma atividade. Nesta situação, há o risco de causar compressão nos tendões8; 10.


Estes fatores atuam de maneira que um pode potencializar o outro e devem ser considerados conforme a duração, intensidade e freqüência de cada fator de risco na jornada de trabalho3; 6; 11.

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A duração prolongada de uma tarefa com sobrecarga estática ( contração muscular sustentada ) leva a fadiga muscular localizada ou generalizada. Quanto mais longo o período de sobrecarga estática, mais longo será o período de recuperação muscular ( período de repouso muscular necessário para que o músculo se recupere após o esforço ) .Por isso, pequenas pausas na rotina de trabalho ajudam a reduzir os efeitos da duração da exposição3.
A intensidade de força necessária para a realização da tarefa deve ser avaliada tanto com relação à quantidade quanto à qualidade de força aplicada. Neste ponto, é importante observar o grau de desvio de postura e a pressão aplicada por superfície 3.
A freqüência com que a tarefa é executada ( o número de repetições da tarefa na unidade de tempo ) também tem influencia na recuperação muscular. Atividades com alta freqüência não permitem a recuperação muscular3.
A repetitividade da tarefa é o fator habitualmente mais referido9, principalmente quando associado a posturas inadequadas, trabalho muscular estático e/ou com aplicação de forças excessivas 12.

Estes fatores biomecânicos ainda são influenciados por fatores individuais, como idade, tipo físico, aptidão física e gênero13.

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O processo de envelhecimento se inicia entre 30 e 40 anos de idade, acelerando-se a partir dos 50 anos. Observa-se uma degradação progressiva da função cardiovascular, força muscular, flexibilidade das articulações, dos órgãos do sentido e das funções cerebrais. A psicomotricidade e os movimentos tornam-se mais lentos com a idade, prejudicando o tempo de reação. Isso dificulta o desempenho de tarefas mais complexas, que demandam capacidade de discriminação entre vários entre vários estímulos diferentes. Por isso, alguns autores documentam que os sintomas osteomusculares predominam acima dos 30 anos de idade4.
Ainda com relação à idade, observa-se que pessoas que iniciam sua vida profissional precocemente, entre 5 e 15 anos de idade, têm maior risco para o desenvolvimento de LERDORT2.
A aptidão física é definida como a capacidade de realizar e manter as atividades diárias. Também está associada à tendência de baixo risco ao desenvolvimento prematuro de doenças e restrição de movimentos.14
A maior incidência no sexo feminino é justificada por questões hormonais, dupla jornada de trabalho, falta de preparo muscular para determinadas tarefas e também pelo aumento do número de mulheres no mercado de trabalho9; 15.

Organizacionais

Os fatores organizacionais são aqueles relacionados ao processo de trabalho, como a duração da jornada, as horas extras, ausência de pausas, falta de rotatividade de tarefas, ritmo de produção acelerado, exigência de produtividade, mecanização do processo de produção e informatização das áreas de serviço, redução do quadro de funcionários sobrecarregando os demais, dificuldade de comunicação, falta de informação sobre os processos de trabalho, hierarquia e relacionamento entre a chefia, funcionários e supervisões5; 6; 16


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Observa-se que a LERDORT é mais freqüente nos trabalhadores braçais e com baixa escolaridade.4


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As influências da economia do mundo globalizado interferem tanto no trabalhador como na empresa, conforme os pontos vulneráveis de cada indivíduo e de cada empresa,3 seja no setor privado ou no setor público.

Setor privado
Atualmente, o setor privado é regido pelas estratégias de racionalização, que é um modelo da administração científica que prioriza tarefas simples e rápidas, para aumentar a produção, em tempo mais curto com redução dos gastos. Esta modificação do sistema de trabalho para otimizar o processo de produção pode ser feita através da mecanização da produção, informatização dos serviços, implementação de novas tecnologias ou gestões empresariais.
No entanto, em todas as estratégias de racionalização, observa-se que o trabalho é intensificado. Isso repercute no comportamento dos trabalhadores, na antecipação, durante e após a instalação da racionalização, sobretudo pelo sentimento de insegurança em relação ao futuro16.

Setor público
Em relação ao serviço público no Brasil, alguns autores se reportam a “patologia organizacional”. Observa-se a “desmotivação” do servidor e a precariedade das condições de trabalho, com equipamentos insuficientes e inadequados, espaços mal desenhados e práticas gerenciais distantes da realidade. Também é importante lembrar que, assim como o setor privado, o setor público também tem sido submetido a diferentes formas de racionalização do sistema de produção e intensificação do trabalho, além da pressão, por parte dos cidadãos mais conscientes de seus direitos e impacientes com a ineficiência do funcionamento dos serviços17; 18.



Psicossociais
É importante considerar que o trabalho não é somente a execução de atividades produtivas, mas também um espaço de convivência.19. Através do trabalho, o ser humano busca seu sustento, satisfação, valorização, realização e reconhecimento, não somente na organização, mas na sociedade. Além disso, proporciona aprendizagem e autonomia6; 20; 21; 22.


O trabalho tem importância fundamental na qualidade de vida do individuo. Isso é influenciado pela suas expectativas quanto à carreira, as exigências do empregador, suporte social no trabalho, satisfação com o trabalho, suas experiências anteriores de trabalho, bem como às características de sua personalidade e seus valores culturais6; 7; 23; 24.

A experiência mostra que os fatores sócio-econômicos fora do ambiente de trabalho, como ameaça de desemprego, baixa renda familiar, acesso a benefícios compensatórios e ameaça à aposentadoria, interagem com as demandas do processo de trabalho e com os fatores individuais3.

Outros fatores de risco psicológicos são o sentimento de menos valia, insegurança em relação ao futuro, inconformismo, incertezas, que podem estar associados a comportamentos de passividade, resignação e expectativa de uma solução capaz de lhes salvar da doença, da incapacidade e da dor crônica6. A insegurança em relação ao futuro e da demissão é outro fator de risco16.

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O papel do trabalho na vida do indivíduo
Segundo Freud, a felicidade está no ato de amar e trabalhar. O trabalho não é somente a execução de atividades produtivas, mas é também um espaço de convivência, com aspectos relacionados ao mundo social, à saúde e ao mundo subjetivo (referentes à pessoa como sujeito ou referente ao espírito), como à construção do ego (núcleo da personalidade do indivíduo) e da auto-estima (apreço ou valorização que a pessoa confere a si mesma, permitindo-lhe ter confiança nos próprios atos e pensamentos)19.

O trabalho tem importância fundamental na vida do individuo. Pelo trabalho, se consegue sustento, satisfação, valorização, realização e reconhecimento, não somente na organização, mas na sociedade. Além disso, proporciona aprendizagem e autonomia6; 20; 21; 22.

Observa-se que o estilo de vida de uma pessoa é constantemente influenciado pelo seu contexto, isso inclui as condições familiares, profissionais, sociais, econômicas e políticas do ambiente em que vive6; 25.

A relação afetiva que o indivíduo desenvolve com o trabalho é muito importante26. Observa-se maior propensão ao desenvolvimento de LERDORT em trabalhadores insatisfeitos6 e com menor escolaridade4.

Prevenção e Avaliação de risco
Na literatura, estão disponíveis instrumentos de várois avaliação de risco.


1              VERTHEIN, M.; MINAYO-GOMEZ, C. A construção do "sujeito-doente" em LER. Rio de Janeiro: Hist. cienc. saude-Manguinhos. 7 2000.

2              GHISLENI, A.; MERLO, A. R. C. Trabalhador Contemporâneo e Patologias por Hipersolicitação: Psicologia: Reflexão e Crítica. 18(2): 171-176 p. 2005.

3              AZAMBUJA, M. I. R.; VIANA, M. C. V. Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT). In: ARTMED (Ed.). Medicina Ambulatorial: Condutas de Atenção Primária Baseadas em Evidências. Porto Alegre: Duncan, B.B. Schmidt, M.I Giugliani, E.R.J., 2006. cap. 136, p.1239-51. 

4              PICOLOTO, D.; SILVEIRA, E. Prevalência dos sintomas osteomusculares e fatores associados em trabalhadores de uma indústria metalúrgica de Canoas - Rio Grande do Sul. SILVEIRA e E. Rio Grande do Sul: Ciência & Saúde Coletiva. 13(2): 507-516 p. 2008.

5              MACIEL, R. Quem se beneficia dos Programas de Ginástica Laboral? ALBUQUERQUE, A.: Cadernos de Psicologia. 8: 71-86 p. 2005.

6              SANTOS, A. C.  et al. Impact on the Quality of Life of an Educational Program for the Prevention of Work-Related Musculoskeletal Disorders: a randomized controlled trial. BMC Public Health, v. 11, p. 60,  2011. ISSN 1471-2458. Disponível em: < http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21276217 >.

7              INSS. INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS. INSS: INSS 2003.

8              ORSO, P.  et al. Reflexões acerca das lesões por esforço repetitivo e a organização do trabalho. MUROFUSE e NT. Campinas: Rev. online Bibl. Prof. Joel Martins. 2: 47-58 p. 2001.

9              SANTOS, A. Impacto na qualidade de vida de um programa educacional para prevenção de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (LERDORT). 2009. 97 (doutorado). Ciências Médicas, UFRGS, Porto Alegre.

10             BAWA, J. Computador e saúde 1997.

11             MAYER, T.; GATCHEL, R.; POLATIN, P. Occupational Musculoskeletal Disorders

Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins, 2000.   

12             MENDES, R. A.; LEITE, N. Ginástica laboral: princípios e aplicações práticasBarueri, SP: Manole, 2004.   

13             DAVID, G. C. Ergonomic methods for assessing exposure to risk factors for work-related musculoskeletal disorders. Occup Med (Lond), v. 55, n. 3, p. 190-9, May 2005. ISSN 0962-7480. Disponível em: < http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15857898 >.

14             WINNICK, J. P.; SHORT, F. X. Teste de Aptidão Física para jovens com necessidades especiais. 1ª edição brasileira.  Manole, 2001.   

15             MIRANDA, C.; DIAS, C. LER - lesões por esforços repetitivos: uma proposta de ação preventiva: Revista CIPA: 32-49 p. 1999.

16             WESTGAARD, R. H.; WINKEL, J. Occupational musculoskeletal and mental health: Significance of rationalization and opportunities to create sustainable production systems - A systematic review. Appl Ergon, v. 42, n. 2, p. 261-96, Jan 2011. ISSN 1872-9126. Disponível em: < http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20850109 >.

17             ASSUNÇÃO, A. De la déficience à la gestion collective du travail: les troubles musculo-squelettiques dans la restauration collective. 1998.  (doctorat). d’Ergonomie, EPHE, Paris.

18             JACKSON FILHO, J. M. Desenho do trabalho e patologia organizacional: um estudo de caso no serviço público. Rev. Produção, v. 14, n. 3, p. 58-66,  2004.  

19             MERLO, A. R. C.  et al. O trabalho entre prazer, sofrimento e adoecimento: a realidade dos portadores de lesões por esforços repetitivos. Psicologia & Sociedade, v. 15(1), p. 117-136,  jan/jun.2003.  

20             FARIA, A.; BARBOZA, D.; DOMINGOS, N. Absenteísmo por transtornos mentais na enfermagem no período de 1995 a 2004. São José do Rio Preto: Arquivos Ciência e Saúde. 12: 14-20 p. 2005.

21             GUIMARÃES, R. S. O. O absenteísmo entre os servidores civis de um Hospital Militar. 2005. 83 (mestrado). Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro.

22             DEJOURS, C. Por um novo conceito de saúde. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional. São Paulo. 14: 7-11 p. 1986.

23             DAVID, G.  et al. The development of the Quick Exposure Check (QEC) for assessing exposure to risk factors for work-related musculoskeletal disorders. Appl Ergon, v. 39, n. 1, p. 57-69, Jan 2008. ISSN 0003-6870. Disponível em: < http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/17512492 >.

24             CHIAVEGATO FILHO, L.; PEREIRA JR, A. Interface. Comunicação, Saúde, Educação: 149-62 p. 2004.

25             CANDEIAS, N. Conceitos de educação e de promoção em saúde: mudanças individuais e mudanças organizacionais. Rev Saúde Pública. 31(2): 209-13 p. abril, 1997.

26             CHIAVEGATO FILHO, L. G.; PEREIRA JÚNIOR, A. LER/DORT: multifatorialidade etiológica e modelos explicativos. Comunic., Saúde, Educ., v. 8, n. 14, p. 149-62,  set.2003-fev.2004.